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terça-feira, 26 de julho de 2011

Na região com a maior reserva hídrica do estado, milhares de pessoas não têm água e ainda são obrigadas a pagar a conta


A falta e o racionamento forçado d’água afetam milhares de famílias urbanas de várias cidades do Vale 


Por Sousa Neto/Folha do Vale


Uma conta d’água de 32 reais que teve, de um mês para o outro, um aumento de cem por cento. Mas o pior desse reajuste, que passou a vigorar em maio passado, não é o valor adicional a pagar, conforme o dono da casa, mas a cobrança por um serviço que não está sendo prestado corretamente. “Eu pagaria satisfeito se tivesse água, mas aqui a água só chega à noite, duas ou três vezes na semana, e ninguém pode dormir esperando um pingo d’água na torneira”, lamentou o morador do conjunto Chagas Soares, um dos setores urbanos mais habitados de Itaporanga.

O problema relatado por esse morador é o mesmo de todos os habitantes do conjunto, mas, próximo dali, a realidade e os relatos são ainda mais dramáticos: no bairro Balduino de Carvalho a água não tem força para alcançar as torneiras dos moradores hora nenhuma e eles são obrigados a escavar buracos no leito da rua para captar um pouco d’água diretamente da rede central da Cagepa (Companhia de Água e Esgoto da Paraíba), que ainda tem o descabimento de mandar um talão de cobrança para a casa dessas pessoas, um desrespeito flagrante ao código do consumidor. “Aqui o sofrimento é grande, e, além da falta d’água, as ruas, como você vê, não são calçadas e as crianças vivem dentro dos esgotos”, lamentou uma moradora à beira de uma das cacimbas urbanas: procurava, agachada sobre o buraco, de pouco em pouco, conquistar uma lata d’água.

E um pouco mais adiante, o problema é ainda mais grave: na Vila Mocó nem as cacimbas dão água. A comunidade lava e cozinha de um poço salgado aberto no local e, para beber, mendiga um copo d’água nos buracos do Balduino. “Até a eleição passada, vinha um carro- pipa botar água para a gente aqui, mas de lá pra cá não veio mais”, comentou um habitante da Vila.

Em Itaporanga, que tem 23 mil habitantes e é a maior cidade do Vale, não são apenas esses bairros que padecem pela falta d’água: o problema afeta milhares de pessoas e quase todos os setores urbanos: Alto das Neves, Bela Vista, Alto do Ginásio e até ruas centrais também sofrem pela precariedade e incapacidade do sistema adutor local, que deveria ter sido ampliado há pelo menos 15 anos, mas a falta de vontade política dos canalhas que ocuparam o palácio da Redenção nas últimas décadas nos logrou essa lamentável situação sanitária, cujas maiores vítimas são as crianças e os idosos.

O maior índice de mortandade infantil de Itaporanga está exatamente nas áreas mais afetadas pela falta de água e esgoto canalizado, entre os quais Balduino, Chagas Soares e Vila, conforme apurou a Folha (www.folhadovali.com.br).

Parece irônico, mas estamos falando de uma cidade a poucos quilômetros de um açude com 10,6 milhões de metros cúbicos d’água e localizada na região que tem 45% de toda reserva de água doce da Paraíba.

São centenas de grandes e pequenas barragens espalhadas por toda a região, entre as quais o Coremas/Mãe D’água, com 1,3 bilhão de metros cúbicos d’água, uma das maiores do Nordeste.

Estima-se que o Vale tenha hoje mais de 2 bilhões de metros cúbicos d’água armazenados, mas, lamentavelmente, mal distribuídos: além das populações difusas, que sofrem com a sede a cada período de estiagem, de julho a dezembro, em função da seca dos pequenos reservatórios, várias comunidades urbanas regionais também são afetadas: no caso das cidades, falta adutora para levar água às torneiras da população.

Outras cidades afetadas

Conceição está cercada por barragens, entre elas Condado, Ladeira Vermelha e Vidéo, que somam atualmente 46 milhões de metros cúbicos d’água, mas grande parte da cidade vive sedenta, especialmente os bairros periféricos. São milhares de conceiçoenses que há anos sofrem com a falta d’água, problema que compromete drasticamente a saúde pública. Há também sérios questionamentos com relação à qualidade da água servida à população: além de pouca, duvidosa.

Em São José de Caiana o problema também é gritante: a ampliação da adutora local foi iniciada, mas não concluída, assim como ocorreu com Itaporanga. Revoltados, os caianenses estão rubricando um abaixo-assinado e pretendem levar o problema ao atual governador.

Igaracy é outra localidade à beira de um açude e que também passa sede: há muito tempo, a comunidade sofre com um racionamento d’água e há períodos de faltas generalizadas, afetando quase toda a população urbana. Além disso, o açude que abastece os igaracienses, por ficar bem próximo da área urbana, é atingido por esgotos e entulhos produzidos pela cidade, o que compromete a qualidade da água, segundo os próprios moradores locais.

Parte do açude de Coremas está em território de Piancó: a água está bem próxima da cidade e há outras opções de abastecimento, mas a comunidade piancoense também é vítima da falta d´água. Bairros como Campo Novo, conjunto Lúcia Braga, Padre Luciano e outros são terrivelmente castigados pelo problema.

Todas essas cidades, além de Diamante e Ibiara, necessitam, com urgência, da ampliação do seu sistema adutor, como meio de garantir água, o que significa saúde e qualidade de vida para a população, mas, até o momento, apenas a ampliação da adutora de Itaporanga foi anunciada pelo Governo do Estado.

Mas não basta adutora, é preciso os poderes públicos municipal, estadual e federal unirem força para um grande investimento em saneamento básico nas cidades regionais: canalização de esgoto e calçamento de ruas são o caminho para livrar milhares de pessoas da doença e preservar o meio ambiente: o maior patrimônio natural da região, o rio Piancó, também está sendo infeccionado pela precariedade sanitária dos nossos centros urbanos, que hoje abrigam 98 mil pessoas e depositam seus dejetos direto ou indiretamente no rio.  

Foto: manhã desse domingo, 24: crianças da Vila Mocó em uma longa e cansativa caminhada para botar água em casa. Daqui a pouco, eles já serão eleitores e ainda não sabem o que é ter água encanada na própria moradia.

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